sexta-feira, 8 de junho de 2012
Amar demais não faz mal
Amar demais não faz mal
Dar ao seu filho a certeza do seu amor incondicional mesmo quando as frustrações dele sejam provocadas por você. É, não é fácil. Mas essa é a sua maior prova de afeto e o caminho para que ele aprenda a importância desse sentimento para sempre (Ana Paula Pontes - Para Revista crescer)
Quem cansa de agarrar, abraçar, encher o filho de beijos? E como algo tão gostoso pode ser “demais da conta”? Tentar concretizar esse amor para a criança é fundamental para que ela sinta segurança em qualquer situação que venha a enfrentarComo você descreve o amor que sente pelo seu filho? E o aperto no peito que dá toda vez que é preciso dizer não? E aquela felicidade plena só de vê-lo sorrindo? Provavelmente você não vai conseguir mensurar mesmo um sentimento que parece só aumentar. Mas, aposto, vive pensando: será que amar demais pode fazer mal? Posso “estragar” meu filho enchendo ele de carinho o tempo todo?
A resposta é... não. Amor demais não faz mal. E temos comprovação científica de que o afeto só faz bem. Um respeitado estudo que durou 34 anos, rea-lizado pela Duke University, dos Estados Unidos, acompanhou 482 pessoas desde o primeiro ano de vida e mostrou que, quanto mais forte o vínculo afetivo da mãe com o filho, mais baixos eram os níveis de ansiedade, estresse e hostilidade na vida adulta. Sim, são os beijos e abraços que não cansamos de dar nos filhos que vão fortalecê-los para quando tiverem de enfrentar conflitos mais tarde. Pense quantas vezes em um momento difícil é um acalanto se lembrar do colo que recebemos dos nossos pais, avós, tios. E não é só isso.
O lado emocional influencia na saúde física também. Segundo Alessandro Danesi, pediatra do Hospital Sírio-Libanês (SP), em uma consulta pediátrica a doença não pode ser analisada isoladamente. Um atraso no desenvolvimento da criança – seja para sentar, engatinhar, falar – ou até uma crise de asma, dor de cabeça ou barriga sem motivos aparentes, pode acontecer por conta do ambiente a que ela está exposta. Para Danesi, nos primeiros meses de vida não existe manha. “O bebê acabou de sair da barriga da mãe, ora! Precisa de carinho e conforto”, diz. Ou seja: beije, abrace, segure seu filho no colo quantas vezes quiser. Esse carinho precisa ser demonstrado o tempo todo, das mais variadas formas. E, sim, pode exagerar sem culpa!
E colo é coisa de se dar a vida toda. Mas, conforme a criança cresce, a forma e os limites mudam, você sabe, mas a essência, não. Da sua experiência com família, o psicólogo Ivan Capelatto alerta: o cuidado jamais pode ser negligenciado. “A criança precisa sentir que a família está presente em sua vida, que esse amor vai acompanhá-la até quando crescer, que vai poder contar com ele sempre, ainda que a frustração seja inevitável”, afirma. É como se disséssemos: o fato de eu amar você não quer dizer que vai ter tudo que quer. Nem de mim, nem dos outros. E é preciso se manter firme, mesmo depois que ele abrir o berreiro, pois isso também é demonstração de afeto e é aí que vai nascer algo que a natureza não dá: a autoestima. “É ela que vai proteger a criança do bullying, dar suporte emocional para que consiga lidar com as adversidades, dar segurança para que tenha autonomia e faça suas escolhas”, diz Capelatto.
Um amor pelo filho é algo tão difícil de descrever que há quem não saiba lidar com essa emoção nova e, pasmem, chega a acreditar que não ama o filho do jeito que deveria. Aconteceu com a atriz e professora de teatro Nádia Hellmeister Morali, 29 anos, mãe de Pedro, hoje com 2. Para engatarmos uma conversa sobre o amor que sentia pelo filho, ela logo lembrou como foi delicado entender seus sentimentos nos primeiros dias ao lado dele. “Sempre me achei diferente de muitas mães porque não sabia direito o que sentir quando olhava para o Pedro. Me surpreendi quando me dei conta de que, à medida que eu cuidava dele, esse amor aumentava”, diz Nádia, que percebeu numa troca de fralda de cocô como cada participação na vida do filho pode despertar esse amor que a gente idealiza tanto. Esse “ideal” é o ponto principal abordado pela psicóloga Liana Isler Kupferman. É algo que começa antes da gravidez, no desejo de ter um filho. Mas, quando o bebê nasce, acontece a mudança do imaginário para o real e é nesse momento, digamos, “concreto” da relação que podem surgir dificuldades de criar vínculo com o bebê. Só que esse sentimento é precoce. “O vínculo é formado somente na convivência”, diz a especialista.
Amor com amor se aprende
É na convivência também que aprendemos uma série de medidas para dar conta de amar e educar ao mesmo tempo. Pois quando percebemos o tamanho do amor que podemos sentir por um filho, a tarefa mais difícil é não superproteger. Sim, amar demais não faz mal. Mas superproteger a ponto de não deixá-lo experimentar o novo por medo de que algo ruim aconteça, pode prejudicá-lo. Por isso voltamos à questão do “ser firme”, ainda que, muitas vezes, o que vem em troca não seja nada agradável.
“Um simples ‘não’ pode engatilhar seus olhos de fúria e descarregar uma onda de ódio que parece amaldiçoar as três últimas gerações. Mas antes de sucumbir ao desgosto e perguntar aos céus se ‘hunf! é para isso que a gente cria filhos?’, é bom saber uma coisa: é nessas horas que as crianças dão seus maiores saltos de crescimento. Ao contrário do que parece, é assim que os pequenos podem consolidar seu amor pelos pais”, afirmam os autores Ivan Capelatto, David Moisés e Angela Minatti no livro Prepare as Crianças para o Mundo, parceria do Unicef e Instituto Ayrton Senna.
Pais amorosos não são pais permissivos. “Achar que impôr limites pode fazer os pais perderem o amor dos filhos é paranoia. Se sempre for baseado no respeito à criança, essa turbulência não vai provocar isso”, afirma o psicólogo Yves de La Taille, um dos coordenadores do Instituto de Psicologia da USP. Assim como tudo na educação do seu filho, o desenvolvimento da capacidade afetiva dele se dá a partir do que aprende. Conceitos como empatia, solidariedade ou compaixão só se consolidam quando os pais têm o hábito de ouvir o que os filhos têm a dizer. Começa na primeira infância, quando eles ainda não são capazes de articular os sentimentos. O mesmo vale para a maneira como você se relaciona com seu companheiro, seus amigos, seus pais, irmãos, os empregados da casa, se você mente ou não, se sabe perdoar. “Me vigio o tempo todo, porque sei que, mais do que as minhas palavras, são as atitudes que vão fazer diferença na educação do Pedro. Hoje, eu me encanto toda vez que observo como ele trata as pessoas. É recompensador”, diz a atriz Nádia.
Essa dedicação exige tempo. Principalmente se a quantidade de horas ao lado do seu filho estiver longe do que você gostaria, é fundamental que esse momento seja exclusivo com ele, longe do celular, do computador, da novela. E que também esse amor jamais seja transmitido somente com presentes ou outros agrados. Que tal fazer uma salada juntos, arrumar o armário, brincar de cabaninha, dormir na mesma cama de vez em quando? Afinal, o que importa é poder construir boas memórias.
Dar amor ao seu filho é ensiná-lo a viver, prepará-lo para o mundo. Para este mundo que está aqui e agora, não somente para o futuro. Passar noções de cidadania, do respeito pelo outro, por mais diferente que esse seja de nós, até porque ninguém vive sozinho. Ensinar a cuidar da natureza para o seu futuro, dos seus filhos e netos e, principalmente, mostrar que são nas coisas simples que o amor está realmente mais presente.
É por isso que amar a criança com todos os cuidados que a educação dela merece nunca, nunca vai ser demais. E será o maior aliado no caminho por um mundo melhor.
Dicas práticas
Fique junto
Sua presença é fundamental para a criança se sentir amada. A troca da fralda, a hora do banho, da lição de casa, ir de mãos dadas até a padaria são momentos especiais para ela.
Escute (e respeite!)
Quando seu filho contar algo errado que fez, não o reprima. Oriente-o como deveria agir e deixe claro que está chateado mas que isso não vai interferir em nada o amor que você sente por ele.
Seja firme
Na hora do limite, mantenha a sua palavra. As crianças sentem que os pais se importam ainda mais com elas quando há a persistência no cuidado.
Surpreenda
Mostre como o amor pode ser explícito de forma simples e não por isso é menos intenso. Deixe um bilhetinho dentro da lancheira da escola. Imagine a carinha dele na hora do recreio ao ler o que escreveu?
Outras fontes: Como Realmente Amar Seu filho (Ed. Mundo Cristão); Honrar a Criança – Como Transformar Este Mundo (publicação do Instituto Alana)