Por Renata Pena
- Meu filho, com sete meses já engatinha!!
- Meu filho, com nove meses já anda!!
- Meu filho, com quatro anos já lê!
- Meu filho, com seis anos já é campeão de judô!
- Meu filho, com sete anos, tem um ouvido musical que é uma coisa de louco!
- Meu filho é o melhor da classe em Matemática!
E por aí vai.
A quantidade de cobranças que despejamos sobre nossos filhos, desde seus primeiros minutos de vida, é imensa. Sem dar-nos conta, construímos imensos castelos de expectativas que não queremos ver frustradas, e jogamos sobre eles o peso dessas cobranças, quase sempre insconsciente e desavisadamente.
Eles são apenas crianças, chegam ao mundo querendo respirar leveza e liberdade, mas é como se desastradamente contássemos com eles para fazer aquilo que, do alto da nossa insegurança, não conseguimos: validar nossa importância, mostrar que somos capazes, bons, fortes, dignos de amor e reconhecimento. É como se nossos filhos pudessem conquistar para nós a aprovação alheia que tanto desejamos.
De maneira atrapalhada, depositamos sobre seus pequeninos ombros um peso desproporcional, desumano: o peso das realizações das quais não demos conta por nós mesmos. Queremos que realizem, que sejam, que façam e aconteçam, porque nós mesmos pensamos não ter podido tudo o que queríamos – ou, para colocar cada coisa em seu devido lugar, tudo o que esperavam de nós.
Na ânsia de ver satisfeitas as expectativas – aquelas que o mundo nos fez acreditar que eram nossas, embora não fossem -, negligenciamos a maravilha que a vida nos reservava ao nos fazer mães e pais: a oportunidade bonita e especial de nos despir das ideias pre-concebidas, das projeções, e abrir os olhos, os braços e o coração para aquele ser único que nos foi concedido como companheiro de jornada, como mestre a aprendiz a um só tempo.
Toda criança vem ao mundo carregando em si um pacotinho de possibilidades. Ela pode muitas coisas. Há de querer muitas coisas, realizar muitas coisas. Há de sonhar muitos sonhos. Mas nada disso tem a ver conosco, nada disso nascerá de nós nem precisará de nossa aprovação ou concordância. Apenas, se soubermos amadurecer o suficiente para estar presentes como se deve, teremos a sorte de que compartilhem conosco os bonitos passos desta caminhada, que não há de ser previsível, nem comparável a nenhuma outra. Mas ela, a caminhada, bem como as conquistas e tropeços que dela hão de fazer parte, pertencem a eles, e não a nós.
Nossos sonhos são nossos. Cabe a nós buscá-los ao longo da vida, não permitir que se despedacem (ou, caso deixem de fazer sentido, achar novos sonhos para recomeçar), encontrar espaço para fazê-los realidade. São nossos os desejos, as ânsias, as urgências. São nossas as expectativas. É preciso desenhar uma linha, separar o que nos pertence, para que não os perturbemos com cobranças vazias, desnecessárias, e até cruéis. Eles terão suas próprias urgências, desejos e expectativas, iguais ou diferentes das nossas, não importa. É preciso deixar que as construam, descubram, desvendem por si. Disso se trata a vida, e eles têm o direito de vivê-la. A seu modo.